domingo, 15 de abril de 2012

Ofício CDHC Nº. 014/2012

Exmo. Sr.  Alan Boettger
MD Promotor de Justiça da Infância e Juventude
Comarca de Lages-SC



Prezado Senhor,

Por meio deste, o Centro de Direitos Humanos e Cidadania “Ir. Jandira Bettoni” – CDHC de Lages e Região,  vem perante o órgão do MP-SC desta comarca de Lages, manifestar seu repúdio ao que está publicado no tablóide “Correio Lageano”,  de 31/03/2012 (pág. 03), assinado pelo Sr. Edson Varela, na sua coluna “Opinião e Versão”, onde o colunista, que até onde se sabe é graduado em Ciências Sociais e Direito, destila veneno contra adolescentes em conflito com a lei,  provenientes de outras comarcas e que estão cumprindo suas medidas sócio-educativas no Centro de Atendimento Sócio-Educativo – CASE de Lages, alegando que esta sua opinião é com o intuito de “alertar e proteger a sociedade”. Destilar preconceito e ódio contra adolescentes em  recuperação protege a sociedade do que? Afinal, que sociedade se está a “proteger”? A mesma que gera todos os dias os atos infracionais? Ou está apenas contribuindo para que a sociedade seja tão violenta quanto eles, e contribua para que outros adolescentes encontrem razões para serem violentos?

A mídia, tão ávida em “proteger” e espalhar informações e formação, não se sabe a razão de insistir tanto em criar aparthaides sociais, devendo ser reprimida, pois nada tem a ver com a luta pela liberdade e pela justiça. Aliás, Exa., esse sim,  deve ser o verdadeiro papel da mídia.

Por esta manifestação tão descabida do colunista, e por tantos outros ‘descuidos’ calculados contra as populações mais vulneráveis socialmente, também manifestamos nossa posição, de questionamento quanto aos limites que devem ser impostos à liberdade de imprensa, questionando--lhe quanto ao por quê de esta não  cumprir o seu papel pedagógico na luta contra a opressão e  contra as injustiças de um modelo concentrador e explorador da sociedade, ao invés de degradar ainda mais o humano tão fragilizado presente nos meninos e meninas que cumprem medidas sócio-educativas nas instituições de nosso país?

A opinião ali explicitada, salvo melhor leitura do que preconizam a Declaração dos Direitos da Criança (entenda-se: de 01 a 18 anos incompletos), as Conferencias e Convenções Internacionais das quais o Brasil é signatário, e o ECA, demonstra, além de desrespeito para com os AAAIs, também o desconhecimento de terminologia adequada no trato com nossos jovens, falta de noção do que é o ECA e qual a sua proposta, completa ignorância acerca dos esforços que estão sendo empreendidos para que as medidas sócio-educativas sejam cumpridas e, de fato, venham ao encontro dos interesses sociais, independentemente de onde venham e das infrações que tenham cometido estes jovens.

Importante dizer. Exa., que o CDHC não está aqui falando em nome do CASE, mas tão somente, cumprindo seu papel, para que tais disparates não se repitam, em detrimento do que desejamos construir em prol da Rede de Proteção aos Direitos Humanos em nossa cidade e região, tendo em vista que nossos jovens são os mais vulneráveis a tudo o que está posto na sociedade contemporânea que não lhes oferece perspectivas...

Atitudes e opiniões como esta do Sr. Edson Varela, não contribuem em nada, senão que tudo ao contrário, para a construção de alternativas para nossos jovens. As palavras “delinqüentes”, “marginais”, “delinqüente juvenil”, “bandidinhos”, “menores”, “clientela violenta”, “essa gente”, permeiam o texto de apenas três parágrafos, colocando à mostra todo um preconceito contra o que, bem possivelmente considere o que a sociedade tem de pior, sem conserto e sem nenhum merecimento como ser humano, resultado do que é a sociedade como um todo, incluindo-se a vergonha que é termos que conviver com tantos desmandos políticos e ideológicos, conservadorismo, por parte de gente que se acha melhor, mais importante, mais interessante, mais digno, mais rica, mais branca, mais inteligente, mais honrada, mais capaz, mais isto e mais aquilo e mais aquele outro.

A seleta sociedade de “gente boa”, tendo que lutar contra a “essa gente”, esses “bandidinhos”, esses “marginais” exportados para Lages, esses “menores” e, portanto, mais pequenos em dignidade, em direitos, sem falar de outros qualificativos depreciativos ao humano presente nestas vítimas, que também fazem suas vítimas, não aprendeu ainda que a forma como trata o humano em conflito com a lei, está equivocada e enquanto isso, as soluções dos problemas sociais tão cantados em verso e em prosa, simplesmente não conseguem a eficácia e a eficiência que precisam.

Ao invés de apontar de forma tão mesquinha e pequena a sua “xenofobia” bairrista, porque o colunista não apresenta um projeto alternativo de recuperação juvenil que mereça louvores em toda Santa Catarina?

Com isto, Exa., queremos solicitar do MP, providencias no sentido de coibir tais disparates, reitere-se, esclarecendo, por fim, que o CDHC não é conivente com nenhuma forma de violência, assim como não pode se calar diante do desrespeito para com os jovens acolhidos pelo CASE local ou outro jovem qualquer que é vitimizado de várias formas e que o sistema precisa de algum modo atuar para garantir-lhe o direito de cumprir sua medida sócio-educativa com dignidade, sendo tratado com o respeito que todo ser humano merece.

            No aguardo das providencias solicitadas, reiteramos protestos de estima e apreço.

Atenciosamente,


Erli A. Camargo
OAB-SC 10452
Asses. Jurídica-pedagógica e Vice-diretora do CDHC