segunda-feira, 6 de abril de 2015

Nota de repúdio dos Coletivos de Hip Hop ao Projeto de Emenda Constitucional sobre a redução da maior idade penal



Nota de repúdio dos Coletivos de Hip Hop ao Projeto de Emenda Constitucional sobre a redução da maior idade penal

Elas são pobres e quem são os nobres?
Na tela eu vejo crianças negras como pobres,
Na tela eu vejo crianças brancas como nobres...
Em um sinal, tem um pequeno pedinte,
Isto é sinal, que a nação vai bem mau ...♪ ♫ (Baseado nas Ruas)

Ser periferia é enfrentar todos os dias uma série de violências, entre elas, a violência policial, fato cotidiano que nos atinge diretamente, somxs criminalizadxs pela nossa condição de classe e raça. Ainda enfrentamos à negação dos nossos direitos básicos e o silenciamento que tentam nos impor. As relações trabalhistas capitalistas nos exploram e sugam nossas forças. Não nos faltam motivos para gritar a exclusão que sofremos!

As mídias de massa burguesa ocupam parte de sua programação disseminando o ódio e criando uma verdadeira cultura do medo na e sobre a periferia, mas as cidades são espaços de construção de vínculos - em suas diferentes formas - de trabalho, de estudo, de cultura, de identidade, é a esse lugar que pertencemos, defendemos e lutamos. Quantas reportagens são feitas direcionadas para as mães que perderam seus filhos pela violência policial? Quantas vezes vemos nosso cotidiano ser ridicularizado em novelas e programas de auditório?

Contudo, ser periferia é também resistir e nos organizar para enfrentar esse modelo de sociedade, e assim temos seguido, formando organizações populares e periféricas pelo Brasil inteiro. Diante desse cenário de negação de direitos, temos total compreensão das forças que nos oprimem e viemos a público manifestar nossa revolta. Nós, coletivos de Hip Hop, militantes, MC’s, Bboys, Bgirls, poetizas, poetas, grafiteiras, grafiteiros, DJ’s e representantes da periferia viemos, por meio deste, afirmar nosso repúdio ao Projeto de Emenda Constitucional (PEC) 171/1993 e CONTRA outras ações do poder Legislativo que tratam da REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL.

Nossa voz, nosso grito, nossa realidade é cantada ao som do RAP e representada pela cultura Hip Hop em todos os seus elementos. Organizamos nossos jovens, ocupamos nossas cidades, levamos cultura e resistência as praças, contrariando o projeto que nos é ofertado, dos subempregos, do medo das ruas e assim enfrentamos a violência policial, nos empoderando de conhecimento nos saraus, nos shows e em todos os espaços de educação, lazer e cultura proporcionados por nós mesmos e negado de todas as formas por quem deveria garantir.

E hoje gritamos “A PERIFERIA DIZ NÃO A REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL”.

Apenas 2% dos crimes são cometidos por jovens entre 12 e 18 anos, a esses jovens o Estado deveria garantir uma educação pública de qualidade, acesso à cultura, ao esporte, ao lazer, creches, saúde e o direito à vida, pois estamos diante do extermínio de jovens negrxs e pobres que tiveram seus direitos violados, acessos negados, estamos falando de uma real extermínio, onde a cor da pele e a classe social direciona o alvo.

A PEC em tramitação na Câmara dos deputados será pauta da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) nessa segunda, 30 de março, sua aprovação significa uma criminalização daqueles que sofrem tantas violências - jovens de periferia, negros em sua maioria. O projeto de lei significa um retrocesso do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e da garantia de proteção a esses jovens e suas famílias.

É preciso sim que exista uma rede de proteção aos jovens que cometeram ato infracional, e sobre esse ponto existe ainda uma grande carência de esforço do Poder Legislativo e Executivo, bem como, de uma rede capaz de acolher, cuidar das mães, irmãos, filhas que perdem os seus pela violência policial, pelas condições degradantes dos subempregos, pela falta de segurança alimentar e nutricional, pelas doenças causadas pelas péssimas condições de (re)produção da vida aos quais estamos submetidxs.

O Estado brasileiro tem, nos últimos anos, avançado timidamente no reconhecimento da situação do genocídio da juventude negra, contudo o projeto de lei em tramitação tenta responsabilizar apenas o próprio jovem, tirando a responsabilidade da sociedade e do Estado, que já prevê, no Estatuto da Criança e do Adolescente a responsabilização do adolescente autor de ato infracional, com medidas sócio educativas que não são cumpridas em sua totalidade pelos estados brasileiros. Sendo assim a questão é simples que se cumpra o já posto em Lei.

Relembremos aqui o caso da adolescente de 15 anos que foi mantida por 26 dias em uma cela com cerca de 30 homens, e quantos adolescentes que já passaram pelo sistema sócio educativo que foram assassinados, sem falar nos mortos dentro do sistema. Então como falar de redução da maioridade penal em um Estado que não garante os direitos básicos, a vida?

A PEC tem em sua defesa a falsa ideia de que jovens pobres são criminosos em formação, mas não discute os problemas estruturais da sociedade brasileira, não discute, por exemplo, a situação do sistema prisional brasileiro, que é um grande problema, as mulheres de periferia que acompanham seus filhos, maridos, parentes que estão em reclusão possuem sérias denúncias de tortura aos detentos, além da humilhação e descaso que sofremos a cada visita, o sistema prisional não comporta a quantidade de presos que ficam por mais 06 meses aguardando o julgamento, esse projeto de lei não tem se quer estrutura para ser aprovado e essa aprovação como sempre trás sérias consequências para a população periférica.

Diante do exposto, reafirmamos o posicionamento do movimento Hip Hop e da Periferia organizada em ser contra a redução da maioridade penal e exigimos respeito dos deputados que se intitulam representantes do povo, mas ofendem esse povo em seus discursos de ódio, que é tecido para justificar as ausências de políticas públicas na periferia.  É necessário antes de qualquer decisão que se assuma a péssima distribuição de renda da nossa sociedade e o extermínio do jovens negros de periferia e, com base neste contexto, que esta Câmara priorize a vida da população.

Assinam essa nota:

Coletivo ArtSAM - Arte Solidária, Autônoma e Militante - DF
Núcleo de Formação Família Hip Hop - DF
Família Rap Nacional - SP, MG, BA, RS
Quadrilha Intelectual - DF
Cangaço Negro Mandakaru - BA
Facção Central - SP
Frente Feminista Periférica - DF
F-Dois Família - RO
Baseado nas Ruas - DF
Inquérito - SP
Coletivo Aldeia - GO
Viela 17 - DF
Coletivo João Munlungu - SE
A286 - SP
Clã Nordestino - MA
Frente Nacional de Mulheres do Hip Hop - Brasil
Suburbanos- DF
Quilombo Urbano - MA
Aborígine Rap - DF
Associação Sergipana de Hip Hop - SE
BSB Girls - DF
Jay Grafite - BA
Mulheres em Ação - SP
DJ Raffa - DF
Quilombo Estereótipo - DF
Coletivo 3L - SP
Donas da Rima - DF
MC Murcego - GO
Radicalibres - DF
Fórum de Hip Hop Butantã - SP
Cyphers Cla - DF
Rimologia - SP
Aliados pelo Verso - SE
Tati Botelho - SP
Projeto Cultural MoverMents - DF
Claudia Schapira - SP
Uniquebra - DF
Arsenal do Gueto - DF
Roberta Estrela D’Alva - SP
Sobreviventes de Rua - DF
Conexão Lado Leste - SP
Coletivo Maria Perifa - DF
César Dhummal - SP
Batalha da Senzala - DF
Coma Social - SP
Neros Grafitti - DF
As Lavadeiras - SP
Ratazanas Mal Criadas - DF
Produtora Cultural A Banca - SP
Etnia das Ruas - DF
Hip hop Kidz br - SP
DNA - Da Nossa Alma - DF
GGF A Família - SP
Dr. Paulo - DF
Sara Donato - SP
MOLEC - Movimento Lazer, Esporte, Cultura - DF
Temor Social - SP
Donas Filme - DF
Frente Feminina de Hip Hop de Bauru - SP
Samambaia pra Vida - DF
Peri-Periferia - SP
É Nós que tá - DF
Fantasmas Vermelhos - SP
Movimento Passe Livre (MPL) - DF
Luaa Gabanini - SP
Laila Moreno - DF
Ponto de Cultura Acesso Hip Hop - SP
Juventude Protestante - DF
Israel Alan (Du Guetto) - SP
Vila dos Sonhos - DF
A’s Trinca - SP
Hud - DF
Coletivo de Esquerda Força Ativa - SP
Madiba - DF
Leser MC - SP
Neemias MC - DF
Ktarse - SP
LFdat - DF
Ana Maria Coimbra - SP
Espírito Urbano - DF
Sankofa - SP
Coletivo Expo Hip Hop - DF
Júnior Justino - SP
Batalha do Cinzeiro - DF
Rimação - SP
Tarcísio Pinheiro - DF
WRW - SP
Mc Singelo - DF
José Anderson (Dialetais) - SP
Diga How - DF
Projeto Social Leões das Ruas - SP
Manchinha - DF
André Luiz Ferreira da Silva - SP
Marcos MC - DF
Felipe Gonçalves Henrique - SP
Coletivo Juntas na Luta - SP
Duplo Deck - SP
Realeza Negra - DF
Bê O - SP
De Salto Alto - DF
Felipe de Deus Souza Gomes - SP
Márcia Santos - DF
Pânico Brutal - SP
Besouro Crew - DF
Núcleo Bartolomeu de Depoimentos - SP
Eugênio Lima - SP